O perigo da superficialidade engajada: porque nem tudo precisa de ser uma opinião
Num tempo em que todos dizem tudo, talvez a verdadeira coragem esteja em escutar — e em saber quando o silêncio é mais útil do que a urgência da voz.
Tudo à nossa volta é reacção. Tudo à nossa volta é ouvir para responder,. Sem pensar. Sem interpretar. Tudo é passível de comentário imediato, tudo pede “posição”, tudo se transforma em assunto do dia. As redes sociais transformaram-se em tribunais de opinião, e o algoritmo recompensa quem fala depressa, mesmo que pense pouco. Recompensa quem fala primeiro, mesmo que fale sem saber do que fala. E fala-se com convicção, muitas vezes sem convicções reais.
A isto chama-se “engajamento” — essa palavra tão em voga, que promete relevância e proximidade, mas que tantas vezes resulta numa superficialidade disfarçada de consciência.
A necessidade de se ter (e mostrar) um posicionamento sobre tudo, sempre e agora, esvaziou o acto de pensar. Criou uma cultura onde hesitar é sinal de fraqueza, onde o silêncio é confundido com cumplicidade, e onde quem não tem opinião imediata parece ser menos comprometido com o mundo.
Mas há uma diferença abismal entre ter opinião e ter pensamento.
Opinar é fácil. Basta indignar-se, escolher um lado, publicar uma frase mais ou menos assertiva. Na maioria das vezes parva, mesmo! Mas escrita com convicção. A mesma convicção com que dizíamos à nossa avó que não partimos a janela com a bola, mesmo com a bola debaixo do braço, e os amigos a fugirem pela rua abaixo!
Pensar exige mais. Pensar exige tempo, escuta, capacidade de lidar com ambiguidade, coragem para dizer “não sei”.
Tenho-me apercebido, em ambientes tão distintos como a política local, a formação profissional ou as redes criativas, que há uma pressão crescente para reagir a tudo. Espera-se que o formador “dê a sua posição”, que o político publique um story, que o poeta tenha algo a dizer sobre o tema quente da semana.
Mas nem tudo merece resposta imediata. Nem toda a indignação é lúcida.
E nem toda a presença é útil.
O problema da superficialidade engajada não é apenas ético. É pedagógico. Estamos a formar gerações que acreditam que pensar é opinar. Que se convencem de que expressar é entender. Que confundem visibilidade com valor.
É urgente criar espaço para outra pedagogia: a da escuta crítica, da dúvida fértil, do silêncio pensante. Uma pedagogia que respeite o tempo da elaboração e não alimente a histeria da reacção.
Não é preciso ter opinião sobre tudo.
É preciso ter critério sobre aquilo a que damos voz.
E coragem para, quando necessário, ficar em silêncio. Não por indiferença, mas por respeito à complexidade do real.
O mundo precisa de mais pausas.
Mais elipses.
Mais tempo entre o sentir e o dizer.
E talvez essa ausência de ruído seja, paradoxalmente, o mais forte dos posicionamentos.
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