O astucioso engodo das promoções "sem IVA"!

Desde há muito que nos habituamos a ouvir isto nas rádios e nas televisões. As campanhas de “fim-de-semana sem IVA” ou “desconto igual ao IVA”, soam como mel aos ouvidos das pessoas. E porque não? Basta deixar subentendido que estamos a “lixar o estado” (compra sem IVA) que todos correm a aproveitar.

É, não é?

Não adianta disfarçar.

E as marcas aproveitam-se claramente desta “área cinzenta” e promovem algo que pode ser enganador para o consumidor. E como a ASAE anda mais preocupada a tirar printscreen a websites sem barras de cookies ou banners com datas de início e fim das promoções… passa tudo! Vale tudo. Mas será que vale mesmo?

Campanhas que promovem “preços sem IVA” ou dizem ter “retirado o IVA”, a determinada gama de produtos, podem ser enganadores para o consumidor por diversas razões, especialmente quando não explicam claramente o que isso significa (o que invariavelmente acontece). Vamos lá entender porquê:

  • O IVA Não é Realmente Removido do Produto
    Pois! Estavam à espera de outra coisa? O IVA (Imposto sobre o Valor Acrescentado) é um imposto obrigatório que o comerciante tem de cobrar sobre cada venda ao consumidor final e entregar esse valor ao Estado. Então, quando uma campanha afirma que “removeu o IVA”, na realidade o imposto não é eliminado da venda; o que acontece é uma redução de preço que equivale ao valor do IVA, mas o imposto continua a ser cobrado.

    Na prática, o preço final é recalculado como se estivesse a ser aplicado um desconto. Ou seja, mesmo que o valor final seja equivalente a um preço sem IVA, o imposto ainda está lá (basta consultar o talão de compra); a loja apenas absorve a diferença.

  • A Promoção pode Ser Menos Vantajosa do que parece
    Esse tipo de campanha cria a impressão de que o consumidor está a pagar significativamente menos, mas a redução não é tão substancial quanto poderia ser em uma promoção convencional de “X% de desconto”. Ou seja, uma coisa é uma promoção com “23% de desconto”, outra coisa é uma promoção com “desconto igual ao IVA” (mesmo que este IVA seja a 23%).

    Vejamos: o IVA é calculado sobre o preço base (por exemplo, 23% de IVA significa que o imposto é 23% sobre o preço antes do IVA). Quando uma loja “remove o IVA”, ela aplica um desconto equivalente ao valor do IVA, mas este desconto acaba por ser inferior a 23% no preço final. Por exemplo: se um produto custa 100€ com IVA a 23%, o preço sem IVA seria 81,30€, o que quer dizer que o verdadeiro desconto será de cerca de 18,7% e não de 23% (isto é, de 23,00€), como parece insinuar o anúncio.

  • Possível Confusão sobre o Valor Real do Desconto
    Em muitos casos, a maneira como o “desconto do IVA” é apresentado pode ser confusa para o consumidor, que pensa estar a receber um desconto direto de 23% (ou qualquer outra taxa de IVA aplicável) sobre o preço final.

    Por exemplo: numa promoção que afirma ter “removido o IVA”, o consumidor pode calcular rapidamente um desconto de 23% (se o IVA for 23%), esperando um valor mais baixo do que o que encontra na fatura final.

  • Transparência Limitada
    Essas campanhas frequentemente omitem detalhes importantes nos materiais promocionais, deixando a explicação em letras miudinhas ou não destacando a mecânica real do cálculo. Isto reduz a transparência e dificulta a compreensão por parte do consumidor, o que pode ser considerado uma prática enganosa, de acordo com as normas de proteção ao consumidor e o Código da Publicidade.
  • Impacto na Percepção de Valor e Confiança
    Uma abordagem deste género pode impactar negativamente a confiança do consumidor, uma vez que este pode sentir-se enganado quando percebe que o desconto não é o que aparenta. A longo prazo, este tipo de campanha pode prejudicar a imagem da marca, levando a uma desconfiança em relação a futuras promoções ou campanhas de preço.

Por estas razões, reguladores e entidades de defesa do consumidor deveriam supervisionar campanhas deste tipo, para garantir que o consumidor não seja induzido a erro. Campanhas transparentes e diretas, que informam claramente o valor do desconto real, promovem uma relação mais honesta e eficaz com os consumidores. No nosso país, o “Código da Publicidade” regulamenta práticas de comunicação comercial, incluindo publicidade enganosa. Nele é determinado que toda publicidade deve ser “clara, precisa e não enganosa”, promovendo transparência, para garantir que os consumidores tenham uma compreensão completa e correta da oferta. Quando se trata de promoções e descontos específicos, como no caso destas campanhas que afirmam “remover o IVA” ou vender “sem IVA”, a legislação obriga a aplicação de algumas regras fundamentais com o objetivo de proteger o consumidor:

 

Publicidade Enganosa (Artigo 10.º do Código da Publicidade)

O artigo 10.º define publicidade enganosa como qualquer publicidade que induz o consumidor em erro ou é suscetível de o induzir em erro” quanto à natureza, características, preço ou qualquer outra condição relevante de um produto ou serviço.”

A publicidade que afirma que o IVA foi “removido” ou que um preço é “sem IVA”, mas que apenas aplica um desconto equivalente, pode ser considerada enganosa se não deixar claro que se trata de um desconto aplicado ao preço final e não uma isenção real do imposto.

Clareza e Transparência (Artigo 7.º e Artigo 8.º)

O Código exige que todas as comunicações publicitárias sejam “transparentes e completas”, com informações facilmente compreensíveis. Ou seja, em campanhas de desconto do valor do IVA, é obrigatório explicar claramente a natureza da oferta, especificando que o desconto aplicado é “equivalente” ao IVA e não é uma isenção fiscal.

Detalhes importantes, como a percentagem real de desconto, não devem estar em letras miúdas ou escondidos, mas sim apresentados de forma visível e compreensível para o consumidor típico.

Direitos do Consumidor e Informação Correta (Artigo 9.º)

As campanhas devem respeitar o direito do consumidor à “informação correta” sobre a oferta, para que ele possa tomar decisões informadas. Promoções que usam termos como “sem IVA” devem especificar na própria mensagem publicitária que o valor do desconto “corresponde ao valor do IVA”, mas que o IVA ainda está a ser cobrado.

Cabe à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) a responsabilidade por monitorizar e fiscalizar a aplicação do Código da Publicidade em Portugal. Se uma campanha for considerada enganosa, a ASAE pode atuar e aplicar sanções administrativas, incluindo multas e a suspensão da campanha.

De acordo com o Código da Publicidade em Portugal, campanhas que afirmam “retirar o IVA” devem ser claras ao especificar que o desconto é equivalente ao IVA e não uma isenção do imposto. Caso contrário, essas campanhas podem ser consideradas publicidade enganosa, sujeitando o anunciante a sanções.

Portanto, caros comerciantes, e que tal deixarem de tentar enganar os consumidores e comunicarem com seriedade e competência? Todos têm a ganhar com isso.

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