Com a sazonalidade das andorinhas na Primavera e a pontualidade britânica em todo o rigor, estas individualidades saem de hibernação com os primeiros raios de sol primaveril. Assim que os termómetros atingem a temperatura amena do clima mediterrâneo que nos (deveria) acarinha(r), as nossas estradas são violentamente invadidas por estes personagens  multicoloridos e extravagantes a que chamo “O Gangue da Lycra”.

 

Há qualquer coisa de inexplicável, de intangível, (de etéreo?), que leva homens adultos, com mais ou menos idade, a gastar centenas, milhares, de Euros numa bicicleta e depois enchouriçar-se num finíssimo fato de lycra que não deixa nada à imaginação. Alheios a tudo o que os envolve, enfiam na cabeça uma espécie de ninho esburacado e atafulham as costas do fato como um canguru atafulha a sua bolsa de crias. Curiosamente carregam tudo naqueles bolsos…menos os documentos de identificação.

Em tempos idos, as crises de meia idade, e outras idades, levavam um homem adulto a comprar um descapotável de 2 lugares ou uma moto e acelerar até se espetar pela primeira (e última vez) em algum poste de estrada.

O homem dos tempos modernos tem um fascínio pelo exercício físico e o seu fetiche passa por bicicletas e fatos de lycra. Ele transforma-se ao envergar tamanho fardamento. Depois de se montar no selim, assume uma postura de shock-to-the-system e tal como o estereótipo motard de “feios porcos e maus” viola toda e qualquer lei do código da estrada, enchouriçado em fatos de lycra. Não há um sinal de STOP que seja respeitado. Não existe um semáforo vermelho que não seja ultrapassado. As vias exclusivas para velocípedes são desdenhadas e evitadas como o diabo foge da cruz e as passadeiras para peões são auto-estradas para eles. Mas o que realmente irrita, o que faz, por vezes, querer evocar o longínquo videojogo Carmaggedon, e acelerar a fundo, é a absoluta passividade com que estas chouriças ambulantes pedalam, lado-a-lado, em alegre cavaqueira, enquanto ocupam toda a faixa de rodagem na estrada.

É com esta visão dantesca na nossa frente que muitas vezes somos obrigados a conduzir durante longos e penosos quilómetros de estrada, sendo bombardeados com o brilho da lycra multicolorida, bamboleando ao sabor do vento e da gordura, espetada num milimétrico selim, equilibrado periclitantemente num fio de borracha a que chamam pneu.